Por Rogério Fernandes Lemes – Jornalista
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Revista Criticartes: Secretária Maria Cecilia sou Rogério Fernandes, o Editor-Chefe da Revista Criticartes e, em nome de nossos leitores e colaboradores, agradeço a gentileza por conceder esta entrevista, sobre esse assunto tão importante que é a discussão sobre a reforma do Ensino Médio no Brasil. Na sua avaliação, essa proposta tem sido amplamente discutida na sociedade?
Secretária Cecilia: A motivação para a discussão começou em 2015 e foi provocada nos seminários municipal e estadual para a formulação de propostas para a Base Nacional Curricular Comum (BNCC), audiência pública com o relator da proposta da reforma, senador Pedro Chaves Filho, e nas formações continuadas com professores, que ocorreram ao longo do ano de 2016. Em todas estas ocasiões houve a abertura para discussão e reflexão sobre as mudanças e perspectivas na proposta para o novo ensino médio.
Revista Criticartes: A reforma do Ensino Médio tem sido destaque no cenário brasileiro. O que realmente está por trás da “flexibilização do currículo escolar”?
Secretária Cecilia: Não há nenhuma segunda intenção na flexibilização, muito pelo contrário, o que está sendo proposto é uma inovação na medida em que o estudante poderá escolher um currículo que atenderá seus anseios profissionais ou acadêmicos.
Revista Criticartes: Os docentes estão preparados para essa mudança? Quais os impactos disso na formação do estudante brasileiro?
Secretária Cecilia: Existe uma preocupação desta Secretaria no compromisso de estar sempre propiciando a formação continuada dos nossos professores. A flexibilização não altera a forma, implica no modo, e para isso todos os que estão nas unidades de ensino estão prontos para atuar de maneira a atender a proposta.
Revista Criticartes: Pela proposta da reforma do Ensino Médio os alunos poderão escolher o que irão estudar. Como seria isso levando em consideração as dimensões do país? Os exames nacionais seriam regionalizados? Os alunos brasileiros têm condições de fazer escolhas?
Secretária Cecilia: De acordo com a proposta apresentada pelo Governo Federal, as mudanças contemplam a diversidade espacial e territorial. As demais orientações sobre as aplicações de exames seguem conforme a orientação do Ministério da Educação (MEC).
Revista Criticartes: Houve uma grande movimentação no Mato Grosso do Sul quanto à resolução de incorporar a Literatura às aulas de Língua Portuguesa. Como a senhora vê essa rejeição à medida proposta?
Secretária Cecilia: Convém esclarecer que a Literatura não foi excluída do currículo escolar e a alteração realizada objetiva integrar os seus conhecimentos e saberes aos da Língua Portuguesa não prejudicando, assim, o processo formativo do estudante. Essa proposta visa fortalecer o ensino médio por meio de uma organização curricular menos fragmentada e com número menor de disciplinas. A Secretaria de Estado de Educação de Mato Grosso do Sul (SED/MS) entende que a alteração proposta decorre das discussões relativas à Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e à Medida Provisória n. 746 que altera o ensino médio e define os componentes curriculares obrigatórios, bem como da necessidade da integração curricular promovendo as adequações necessárias à matriz curricular no que tange aos componentes curriculares obrigatórios, conforme legislação vigente.
Revista Criticartes: Os professores trabalham por frentes no atual modelo de educação. Os professores que trabalham Gramática, ou Literatura, ou Produção de texto, nem sempre estão aptos a trabalhar o conteúdo diferente da área em que atuam. Como será feita essa capacitação em tão curo prazo?
Secretária Cecilia: Esta Secretaria compreende que o profissional de Letras está apto para ministrar tanto o conteúdo de Literatura quanto o de Língua Portuguesa, reitera-se que a alteração proposta na matriz curricular atende às discussões e aos documentos elaborados sobre a BNCC, de conhecimento público, e a legislação educacional vigente.
Revista Criticartes: Uma das maiores críticas à resolução apresentada foi o fato de a Literatura ter perdido o seu lugar como disciplina. Várias autoridades da área da educação, principalmente mestre e doutores das Universidades, foram incisivamente contrárias à mudança. Como a senhora avalia esse posicionamento?
Secretária Cecilia: A SED/MS constituiu uma comissão estadual para análise da proposta preliminar da BNCC, publicada no Diário Oficial de 21 de março de 2016, com representantes do Conselho Estadual de Educação (CEE/MS), Fórum Estadual de Educação (FEEMS), Fórum Permanente de Educação Infantil de Mato Grosso do Sul (FORUMEIMS), Fórum Municipal de Educação de Campo Grande (FMECG-MS), Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso do Sul (IFMS), Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino de Mato Grosso do Sul (SINEPE), Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul (UEMS), Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD), Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), União dos Dirigentes Municipais de Educação de Mato Grosso do Sul (UNDIME), Secretaria Municipal de Educação de Campo Grande (SEMED), Universidade Católica Dom Bosco (UCDB), Universidade Uniderp, Federação dos Trabalhadores em Educação de Mato Grosso do Sul (FETEMS) e Faculdade Unigran Capital. Durante o processo, o Ministério da Educação proporcionou consultas públicas, por meio de plataforma digital, onde, individual ou coletivamente, no caso de instituições de ensino ou outras, os participantes puderam analisar e contribuir com a construção da proposta da BNCC. Reitera-se que, em todas as etapas da discussão e elaboração dos documentos, os conhecimentos e saberes da Literatura encontravam-se integrados à Língua Portuguesa.
Revista Criticartes: Embora a mudança seja em nível federal, Mato Grosso do Sul poderia optar por manter a Literatura como disciplina e não incorporada à Língua Portuguesa?
Secretária Cecilia: O Estado de Mato Grosso do Sul adequa-se como os demais Estados e ao Distrito Federal, que já ofereciam o ensino de Literatura integrada ao da Língua Portuguesa.
Revista Criticartes: O coordenador-geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, Daniel Cara explica como a inclusão do ensino profissionalizante, dentre as trajetórias possíveis aos estudantes, durante o novo Ensino Médio, empurrará os jovens com menor renda para carreiras de subemprego, enquanto que os mais ricos focarão os estudos nas áreas que desejam. Qual o seu posicionamento quanto a isso?
Secretária Cecilia: Penso que o direito de escolha do curso profissionalizante vem no sentido de aumentar as chances do jovem. Sair do ensino médio com uma carreira possibilitará uma ascensão universitária, uma realidade muito distante do estudante que termina ou abandona os estudos no ensino médio e segue para um subemprego sem qualificação.
Revista Criticartes: Como o Mato Grosso do Sul está se preparando para esta mudança?
Secretária Cecilia: A SED/MS tem trazido propostas inovadoras e coerentes com as expectativas de mudanças do ensino médio, apoiando a ampliação da carga horária e a formação integral do estudante, tanto nos aspectos cognitivos como nos socioemocionais. Um exemplo é a implantação da Escola da Autoria, onde o estudante é o protagonista do seu processo de aprendizagem e a equipe técnica da SED atua como suporte aos docentes/discentes para que isso ocorra.
Revista Criticartes: A senhora acredita que a retirada da disciplina de Literatura da grade curricular da Rede pública estadual será uma escolha acertada? Como ficarão os alunos do Ensino Médio diante dos vestibulares e do Enem já que ambos cobram conteúdo específico?
Secretária Cecilia: Salienta-se que o processo formativo do estudante não será prejudicado com a alteração, pois os conhecimentos e saberes da Literatura não foram excluídos do currículo escolar e sim integrados à Língua Portuguesa. Dessa forma, fortalece-se o ensino médio, por meio de uma organização curricular menos fragmentada e com número menor de disciplinas, atendendo às propostas do Governo Federal, que visam promover a integração entre as diferentes áreas do conhecimento.
Revista Criticartes: A senhora acredita que integrando Língua Portuguesa e Literatura somente com uma carga horária de 04 aulas semanais, o ensino de qualidade será garantido?
Secretária Cecilia: Em relação ao ano letivo anterior, a carga horária destinada à Língua Portuguesa era de três horas-aula semanais e a de Literatura de duas horas-aula semanais, ou mesmo de uma hora-aula semanal, quando se operacionalizava a Língua Estrangeira Moderna Facultativa, passando, com a integração, para quatro horas-aula semanais. Convém, neste momento, esclarecer que, com a carga horária de 4 horas-aula semanais, os professores de Língua Portuguesa e de Literatura completam sua lotação, no caso de 20 horas semanais, atendendo somente a quatro turmas, enquanto na organização anterior tais professores deveriam atender, no mínimo, oito turmas.
Revista Criticartes: Como ficam os professores de Literatura que fizeram concurso específico para a área, se capacitaram com especialização lato sensu e mestrado e agora simplesmente terão que ministrar aulas fora de sua capacitação?
Secretária Cecilia: O professor de Literatura é formado em Letras, com habilitação em Língua Portuguesa e Literatura. Ele não está saindo de sua capacitação, está apenas sendo remanejado dentro de sua própria área.
Revista Criticartes: Um professor de Literatura ministra aulas de língua portuguesa sem maiores problemas. Mas, um professor de Língua Portuguesa teria alguma dificuldade, tendo em vista que as leituras não acontecem de um dia para o outro?
Secretária Cecilia: Os professores de Língua Portuguesa e Literatura são habilitados em sua formação para atender as duas áreas de conhecimento, partindo da situação que a Literatura é um componente curricular integrado à Língua Portuguesa, as mediações e leituras são feitas de modo interdisciplinar, não havendo dificuldades para ambos. Sendo assim, a SED, atendendo às propostas da Política Nacional, visa promover a integração entre as diferentes áreas do conhecimento, consolidando sua proposta pedagógica, pautada na concepção da interdisciplinaridade como elemento basilar da construção do conhecimento. Nessa perspectiva, no que concerne à Literatura, a proposta visa corroborar a adoção de práticas interdisciplinares, integrando os saberes literários aos de outras áreas. Temos a compreensão da função e da importância desse conteúdo, e é importante ressaltar que a Rede Estadual de Ensino promoveu e incentivou a discussão sobre a BNCC. Em 2016, a SED orientou e realizou com todas as escolas e professores momentos para estudo das proposições curriculares elaboradas pelos especialistas das diversas áreas do conhecimento a serviço do Ministério da Educação.
Revista Criticartes: Como se explica que o Mato Grosso do Sul seja o mantenedor de vários cursos de Graduação e Pós-graduação em Letras, através da UEMS, e agora simplesmente retiram o mercado de trabalho e área de atuação de centenas de jovens? Qual o plano do governo para equilibrar essa equação?
Secretária Cecilia: O fato da disciplina Literatura não estar na grade curricular não implica na qualidade e quantidade dos professores de Letras que se formam em universidades públicas e particulares do nosso País. É grande o déficit de professores para os diversos níveis de educação oferecidos e ademais, é importante que estes docentes se especializem em literatura e assuntos afins, já que está inserida na disciplina de Língua Portuguesa aulas direcionadas à literatura brasileira.
Revista Criticartes: Agradeço pela entrevista Secretária Maria Cecilia. Por favor, suas considerações finais.
Secretária Cecilia: Eu é que agradeço a oportunidade. Temos, na Secretaria de Estado de Educação e nas escolas da Rede Estadual de Ensino, profissionais comprometidos, focados na aprendizagem dos estudantes. Trabalhamos para que nossos estudantes avancem e tenham sucesso, esse é nosso objetivo.
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*Secretária Maria Cecilia Amendola da Motta - Graduada em Pedagogia e Ciências Biológicas, Maria Cecilia Amendola da Motta é mestre em Educação e em Políticas Públicas para a Infância, com especialização em Didática de Ensino Superior, Ecologia e Gestão de Cidades. Ela já foi secretária de Educação de Campo Grande (2005-2012), presidente da União dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime) – Seccional Mato Grosso do Sul (2009-2012); vice-presidente da Undime Nacional (2011-2012); membro do Conselho Estadual de Educação (2009-2012); Maria Cecilia também foi professora no ensino fundamental, ensino médio e superior; coordenadora pedagógica; diretora de escola; assessora no Tribunal de Contas de Mato Grosso do Sul (TCE/MS) na Diretoria Geral de Gestão e Modernização, na área de educação. Atualmente, ela é secretária de Estado de Educação de Mato Grosso do Sul e vice-presidente do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed).
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