sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

A cigarra que encanta e a formiga encantada

  Revista Criticartes - Ano II, nº. 5 - 2016  
Imagem: http://www.contioutra.com

Edvânia Ramos
Aracaju, SE

Todo o dia lá ia a formiga Dudinha ladeira abaixo com uma folha na cabeça. No caminho sempre encontrava a mesma companheira. A cigarra Milena havia se tornado sua amiga no inverno do ano passado e descia, com ela, aquele enorme caminho de barro diariamente, sempre cantando e falando como a pior das tagarelas.
Dudinha sorria com o gesticular exagerado de Milena, outras vezes balançava a cabeça de um lado para o outro como se a achasse meio maluquinha.
Todos os dias era a mesma rotina, o que mudou é que agora, Milena, quando via que Dudinha estava cansada ajudava a amiga a carregar suas folhas, mas nunca em hipótese alguma de boca fechada, sempre cantarolando ou contando estórias da floresta.
Certo dia chovia muito, muito mesmo, um temporal assustador. Em dias como este Milena gostava de ficar escondida no oco de alguma árvore escura, apenas cantarolando para disfarçar seu medo dos trovões. Ficava tremendo imaginando no que poderia lhe acontecer.
Sentiu que algo estava errado. Com a forte chuva o dia pareceu terminar mais cedo e não viu sua amiga voltar. Permaneceu no seu lugar, mas, Dudinha não voltou e isso a deixou triste. Suas pernas pequenas e finas tremiam de medo em pensar que tinha que fazer algo e, o algo, era sair na noite escura a procura da sua amiga.
Olhou pro céu nenhuma estrela, nem mesmo a lua, apenas os trovões e os relâmpagos, mas foi forte e desceu ladeira abaixo, gritando seu nome e cantando para esquecer o medo que tomava seu ser.
“Eu não sou medrosa, sou mesmo é corajosa”. Amiga formiga se me ouve responde! Onde está a graça de brincar de esconde-esconde se o sol ainda não brilhou nem o trovão passou? Essa formiga é mais doida que eu. Exclamou a cigarra encharcada de chuva. Desceu mais um pouco já quase desistindo quando ouviu um respirar fundo, mas lento.
– Dudinha é você?
– Ajude-me amiga cigarra, estou presa no lamarão, não consigo me mexer.
A cigarra correu apresou-se a ajudar a amiga. Retirou primeiro a folha que ela teimava em segurar na cabeça e logo depois puxou seu frágil corpo da lama que prendia suas pernas pequeninas. A formiga sorriu agradecida e perguntou emocionada com o abraço que recebeu.
– Como venceu seu medo de trovões cigarra Milena?
E com olhos marejados ela responde:
– Tudo que vem da natureza é obra divina, devemos respeitar, mas nenhum trovão, nenhum raio, nem a chuva, nem o sol, nem o dia e nem a noite é mais forte que o amor e a amizade que podemos sentir pelo próximo.
A amiga formiga abraçou sua amiga cigarra e juntas retornaram para casa na certeza de que nunca mais estariam sozinhas, seja qual for a tempestade do momento, juntas elas venceriam.
– Sabe o que estive pensando amiga cigarra?
– Formiga pensa? Risos. Sorrindo ela completou.
– No encanto que tem sua melodia, foi o que pensei durante todo o tempo em que estive ali presa.
– Não foi a minha música. Foi o desejo de continuar vivendo. A vida é a mais bela canção amiga formiga e, o coração, é o violão que decifra a letra da melodia que trazemos na alma. 
– Vamos cantar?
– Canta cigarra, canta que na chuva eu danço.
Elas seguiram, sorrindo, abraçadas, celebrando a vida e o encanto do ato viver. Seu medo tem o tamanho que você dá para ele. Procure o deixar menor que um grão de areia e logo um mar de vitórias surge para banhar teus mais belos sonhos.
(Texto dedicado a Maria Eduarda Dias Maia)


  Revista Criticartes - Ano II, nº. 5 - 2016  

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