Rogério Fernandes Lemes*
Foto: Fazenda Pacuri. Rogério Fernandes Lemes em 17 de dezembro de 2017. |
Uma casa de madeira surgiu das lembranças da família de um homem simples. Depois de muitos anos, a casa onde ele nasceu e cresceu foi toda derrubada. Os pais e alguns irmãos se mudaram pra cidade. Ele e outro irmão permaneceram na porção de terra que receberam por herança.
Fez a casinha de madeira com as próprias mãos. Com o resto das madeiras que sobrou da antiga casa carregada de lembranças, de risos, de rezas e punições. Praticamente aquelas tábuas e vigas foram testemunhas de sua infância e juventude. Agora foram descartadas e se, o homem nada fizesse, certamente apodreceriam ou seriam queimadas em algum fogão de lenha.
Primeiro, o homem cavou quatro buracos, para firmar os batentes. Depois pregou firmemente as vigas, as tábuas e assentou duas portas. Por fim, afixou o telhado que era, assim como na primeira casa, tabuinhas feitas manualmente de Tabebuia spp., Bignoniaceae, uma madeira conhecida como ipê. Cada tabuinha fora lavrada e esculpida por seu pai. Agora, seus filhos o ajudavam.
Sentado sobre a viga principal, o homem pedia a cobertura. Os filhos, com os pés no chão, alcançavam as unidades e os pregos. Após várias marteladas, no decorrer da manhã, lá estava ela, pronta, digna para servir de lar, se preciso fosse.
Não havia janela. Não precisava. A casinha era tão baixinha e pequena que bastava abrir uma das portas e tudo clareava.
Por algum tempo aquela casinha serviu para guardar coisas da fazenda. Uma charrete; uma cama com lastros de couro de vaca – onde seu filho mais velho dormiu por alguns anos –; duas rodas de carreta de boi; um pilão todo cheio de teias de aranha; apetrechos de montaria e toda sorte de quinquilharias que se possa imaginar.
O homem sempre dizia aos filhos: “quem guarda o que não presta sempre tem o que precisa”.
Tempo depois, uma família de conhecidos, de tempos antigos, veio prestar serviços ao fazendeiro. Um casal e seus quatro filhos habitaram a casinha. Todos cabiam e viviam felizes. As crianças do casal brincavam com os filhos do fazendeiro, dono da terra, da casinha e, por vezes, dos sonhos dos empregados.
Depois de algum tempo aquela família foi embora. A casinha retornou à sua serventia primeira. Voltaram-se as rodas de carreta, o velho pilão cheio de teias, a cama de couro do filho mais velho, os apetrechos de montaria, as quinquilharias e a velha charrete.
Os filhos do fazendeiro cresceram andando de charrete. Nas tardes de domingo, a família toda ia até a vendinha, ou ao bolicho, como era conhecida nas redondezas. As crianças queriam duas coisas mágicas: caramelos e refrigerante. E, para isso, trabalhavam e se comportavam a semana inteira esperando, ansiosamente, sentirem o gosto do açúcar satisfazendo seus cérebros.
Os filhos cresceram se casaram e tiveram filhos. A casinha continua lá. Firme. Certo dia, o fazendeiro desapareceu sem nunca mais dar notícias de seu paradeiro. A esposa, os filhos e netos ficaram desolados. A saudade tornou-se grande e quase insuportável.
Algumas pessoas disseram que viram o fazendeiro, minutos antes de desaparecer. Contaram que ele estava um pouco triste e resolveu parar de sentir tristeza. Somente ele sabia da existência de uma janela secreta, dentro da casinha. Sem contar a ninguém, ele adentrou pela porta menor e nunca mais foi visto, desde então.
A janela foi fechada e ninguém mais conseguiu achá-la. Mas, ela existe. A sogra do fazendeiro, alguns dias depois, achou a janela e também desapareceu.
Contemplando o interior da casinha de madeira, o filho mais velho apenas viu a cama de couro, a charrete empoeirada, as duas rodas de carreta e as quinquilharias pelo chão. Ele sentiu que a janela existe e que, um dia, todos serão achados por ela.
Fez a casinha de madeira com as próprias mãos. Com o resto das madeiras que sobrou da antiga casa carregada de lembranças, de risos, de rezas e punições. Praticamente aquelas tábuas e vigas foram testemunhas de sua infância e juventude. Agora foram descartadas e se, o homem nada fizesse, certamente apodreceriam ou seriam queimadas em algum fogão de lenha.
Primeiro, o homem cavou quatro buracos, para firmar os batentes. Depois pregou firmemente as vigas, as tábuas e assentou duas portas. Por fim, afixou o telhado que era, assim como na primeira casa, tabuinhas feitas manualmente de Tabebuia spp., Bignoniaceae, uma madeira conhecida como ipê. Cada tabuinha fora lavrada e esculpida por seu pai. Agora, seus filhos o ajudavam.
Sentado sobre a viga principal, o homem pedia a cobertura. Os filhos, com os pés no chão, alcançavam as unidades e os pregos. Após várias marteladas, no decorrer da manhã, lá estava ela, pronta, digna para servir de lar, se preciso fosse.
Não havia janela. Não precisava. A casinha era tão baixinha e pequena que bastava abrir uma das portas e tudo clareava.
Por algum tempo aquela casinha serviu para guardar coisas da fazenda. Uma charrete; uma cama com lastros de couro de vaca – onde seu filho mais velho dormiu por alguns anos –; duas rodas de carreta de boi; um pilão todo cheio de teias de aranha; apetrechos de montaria e toda sorte de quinquilharias que se possa imaginar.
O homem sempre dizia aos filhos: “quem guarda o que não presta sempre tem o que precisa”.
Tempo depois, uma família de conhecidos, de tempos antigos, veio prestar serviços ao fazendeiro. Um casal e seus quatro filhos habitaram a casinha. Todos cabiam e viviam felizes. As crianças do casal brincavam com os filhos do fazendeiro, dono da terra, da casinha e, por vezes, dos sonhos dos empregados.
Depois de algum tempo aquela família foi embora. A casinha retornou à sua serventia primeira. Voltaram-se as rodas de carreta, o velho pilão cheio de teias, a cama de couro do filho mais velho, os apetrechos de montaria, as quinquilharias e a velha charrete.
Os filhos do fazendeiro cresceram andando de charrete. Nas tardes de domingo, a família toda ia até a vendinha, ou ao bolicho, como era conhecida nas redondezas. As crianças queriam duas coisas mágicas: caramelos e refrigerante. E, para isso, trabalhavam e se comportavam a semana inteira esperando, ansiosamente, sentirem o gosto do açúcar satisfazendo seus cérebros.
Os filhos cresceram se casaram e tiveram filhos. A casinha continua lá. Firme. Certo dia, o fazendeiro desapareceu sem nunca mais dar notícias de seu paradeiro. A esposa, os filhos e netos ficaram desolados. A saudade tornou-se grande e quase insuportável.
Algumas pessoas disseram que viram o fazendeiro, minutos antes de desaparecer. Contaram que ele estava um pouco triste e resolveu parar de sentir tristeza. Somente ele sabia da existência de uma janela secreta, dentro da casinha. Sem contar a ninguém, ele adentrou pela porta menor e nunca mais foi visto, desde então.
A janela foi fechada e ninguém mais conseguiu achá-la. Mas, ela existe. A sogra do fazendeiro, alguns dias depois, achou a janela e também desapareceu.
Contemplando o interior da casinha de madeira, o filho mais velho apenas viu a cama de couro, a charrete empoeirada, as duas rodas de carreta e as quinquilharias pelo chão. Ele sentiu que a janela existe e que, um dia, todos serão achados por ela.
* Escritor e Vice-Presidente da UBE-MS
Membro da Academia Douradense de Letras
Palestrante da FliBonito 2017
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